Saturday, July 29, 2006

Da Animação "populista" ao Sadismo de Rua

Nas minhas recordações de aprendiz de artista e educador fiz do Programa de Animação Cultural do Centro Integral de Educação Pública a minha Escola de formação/deformação que me foi ofertada através das oficinas, dos projetos culturais e das tantas outras experiências arte-educativas vivenciadas que fogem aos pressupostos de uma academia de arte clássica.
No início não tínhamos a menor noção do que estávamos nos transformando. O rito de passagem costumeiramente presente em bancos de emprego, refiro-me ao período de estágio, foi imediato ou talvez não tenha acontecido nos moldes normais. Em pouco tempo estava diante de uma comunidade desconhecida tendo que ser um espécime de agente sócio-comunitário, onde a pesquisa sócio-cultural da então comunidade ocupada pelo Ciep era de suma importância para a gestão estreante. Um imenso monumento encantava a uns e desencantava a outros.
O animador cultural tinha a missão de aproximar o gigante dos “quixotes” moradores, promovendo o resgate da herança brasileira e transformando os Cieps “em escolas atraentes, engajadas com o social e aptas a preparar o aluno para o desempenho de sua cidadania” (SEPÚLVEDA). Enfim, ser o elo de integração entre a comunidade e a escola como costumavam dizer os nossos ideólogos mentores. A idéia central era exercer bem a função política “populista” do governador Leonal Brizola que era o sustentáculo do imenso projeto chamado CIEP.
Naquele tempo víamos nossos trabalhos serem organizados por competentes profissionais da arte e da cultura da cidade do Rio de Janeiro. Aconteciam encontros com a coordenação geral que tinham o objetivo de fortalecer este ser “alienígena” da educação provocando-o a encontrar por si mesmo uma resposta para “o que ele esta fazendo ali”. Contudo, apesar de nós animadores culturais, sabermos o certo o que estávamos fazendo lá, o que importava era tirar o máximo de proveito do ensino/aprendizado que o governo estava nos oferecendo. Sem modéstia, considero-me um aproveitador dessa construção que nas suas sutilezas tentava dentre outras coisas colocar em prática o teatro do oprimido, projeto do dramaturgo Augusto Boal.
Como ironia do destino, hoje de fato não sabemos o que estamos fazendo e porque estamos fazendo, uma crise existencial que confirma o título de “alienígena da educação”. Sentimo-nos órfãos de pai e mãe depois dos sucessivos governos que foram se sabotando após 1996 que marcou o fim do mandato do governo Brizola. O máximo que fizeram para aquele “grupo instigante que, com a alegria estampada nos gestos e no coração” (SEPÚLVEDA), foram deixar em nossos contracheques um recolhimento chamado “rio previdência”, uma nomeação em diário oficial como função de confiança do governador e a herança de continuarmos com a sensação de estarmos perdidos ainda buscando respostas. Onde elas estão?
A política “populista” do Leonel Brizola e do então secretário de educação Darcy Ribeiro foi um espetáculo que teve sucesso na estréia e fracasso na temporada, ou seja, a sua descontinuidade é prática comum entre os governos populistas, onde cada um tenta emplacar a sua marca de governo. Todavia o audacioso PROJETO CIEP de Educação, apesar de ser populista tinha um objetivo a ser alcançado.
Paradoxalmente, hoje quando nos deparamos com o populismo reacionário contemporâneo, que tem poucos objetivos nos seus programas sócio-educacionais, temos que ter o máximo de atenção para não sermos partícipes do piscinão de Ramos ou de um restaurante popular. Se assim fizermos estaremos contribuindo com a continuidade de uma política sadomasoquista onde quem recebe o fálico “vale-caridade” fica inteiramente extasiado e prazeroso com o fato de ter sido lembrado e quem dá fica inteiramente satisfeito de estar proporcionando à “ralé estrutural” o prazer da beneficência, criando definitivamente uma relação de dor e prazer insaciável. Votar nos perversos candidatos populistas confirma a disponibilidade do seu corpo/alma para o banquete sádico que pode durar anos a fio.
Lembremos que esse tipo de “populismo sádico” também se expressa em projetos de arte na rua onde a principal persona é a inclusão social, o velho discurso de “estamos tirando das ruas os nossos futuros marginais”. Mas observando mais de perto vemos que esses projetos têm a meta de fazer com que a população média e de baixa renda fiquem dependentes desses programas, porque por trás disso tem sempre a moeda da beneficência.
Para isso dar certo, é necessário que não façamos os nossos atendidos pensar de forma crítica, clara e consciente, é necessário que o entorpeçamos com gestos mecânicos, que o transformemos em meros reprodutores da mesmice cotidiana, objetos ao invés de sujeitos como por exemplo se vê em vários projetos de grafitti existentes no estado de São Paulo e do Rio de Janeiro. Basta distribuirmos sprays nas mãos dos meninos e deixar rolar a criatividade e a imaginação. O objetivo é estar no controle daquelas potencialidades criativas, pois do contrário ofereceria maior perigo para a manutenção do “populismo sádico artístico”.
Talvez a Animação Cultural na sua reestruturação tenha se distanciado dos princípios “populistas”, origem de sua existência e se aproximado em algum momento ao desmascaramento da arte, presente em diversos movimentos de intervenção urbana. No entanto não somos suficientemente fortes para colocarmos em discussão os discursos e as práticas políticas e ideológicas sempre presentes nas plataformas de governo de inúmeros candidatos. É preciso estarmos atento às campanhas políticas que em períodos de quatro em quatro anos acabam despertando a “kundalini adormecida” da massa que estimulada pela fome social e pelo desespero acabam se deixando seduzir pelos Sades contemporâneos, os políticos populistas da atualidade.



Rudolf Rotchild Costa Cavalcante

Os objetivos do projeto "Animação Cultural"

O objetivo do projeto de extensão "Animação Cultural" na parceria PROEX / UENF - Coordenação Regional da Animação Cultural na região NF1 é elaborar em co-participação com os animadores culturais das escolas de Campos dos Goytacazes pertencentes à região NF1 pautas de ação para sua efetiva valorização profissional, conferindo visibilidade pública ao alcance sócio-educativo da animação cultural e êxito em suas atividades na integração escola –comunidade.
Este objetivo acompanha outros tais como contribuir no fortalecimento do vínculo entre a universidade e a escola; organizar palestras, seminários, oficinas com animadores culturais de modo a subsidiar o debate sobre a arte e a cultura na prática da animação cultural; subsidiar animadores culturais em seu trabalho na animação cultural; remontar a história da animação cultural na Educação Pública no estado do Rio de Janeiro, disponibilizando-a aos agentes educacionais, alunos e comunidade.
Os procedimentos metodológicos da pesquisa-ação são caracterizados em torno de um objeto de estudo e de intervenção não posto unilateralmente pelo pesquisador, mas pelo grupo pesquisado, também este pesquisador. A pesquisa em seu planejamento e execução se faz por uma equipe composta de “pesquisadores profissionais” e representantes do grupo ou população-alvo na pesquisa, no caso os animadores culturais; não há o “trabalho de campo”, próprio de pesquisas cujo método baseia-se na consagrada dicotomia sujeito-objeto mas na interlocução contínua entre pesquisadores profissionais e população-alvo na perspectiva de circulação de saberes cujo desdobramento envolve a possibilidade de aprendizado mútuo no pensar e agir na pesquisa. Os dados são analisados na comunicabilidade entre todos os participantes diretos na pesquisa; temas e problemas e os resultados parciais alcançados na pesquisa quando da participação efetiva de indivíduos e/ou grupos da população interessada são divulgados através de “reuniões amplas, onde se espera o efeito de feedback para validação dos dados e onde ‘técnicas simples’ de comunicação são utilizadas (Haguete, 1987:165). As ações prático-reflexivas são concebidas “em função das necessidades da população (Idem. Ibidem.), uma vez que a realidade investigada tem seu fundamento na situação concreta vivida pela população ou público-alvo.
Por fim, há de se ressaltar que está presente neste projeto de extensão a recuperação da história do fenômeno “animação cultural” e sua implementação na rede pública de ensino. Tal estudo acompanha a extensão e permite o trabalho direto com os animadores culturais ao mesmo tempo em que subsidia os pesquisadores na reelaboração de sua prática.

Por que pensar e intervir na Animação Cultural na região NF1?

A ação extensionista que pretendemos desenvolver com o público dos animadores culturais no município de Campos dos Goytacazes, na região administrativa Norte Fluminense 1[1]. Trabalham nessa região 26 animadores culturais, distribuídos em 17 escolas.
Registra-se um declínio continuado do número de animadores culturais desde a implantação dessa função: de pouco mais de mil em todo o estado do Rio de Janeiro atualmente não chega à metade o número de animadores culturais em sua rede ensino. A vigência da animação cultural desde o período de implantação dos CIEPs até hoje é marcada por uma série de descontinuidades, produto da sucessão de governos. A indefinição quanto à regulamentação trabalhista dessa categoria profissional na estrutura administrativa do estado do Rio de Janeiro[2] constitui seu traço mais evidente. Aponta-se a necessidade da parceria entre Universidade e Escola a fim de retomar e reavivar o sentido original da animação cultural como projeto pedagógico e cultural. Como diz Ana Mae Barbosa, também, a “arte serve a instituição escolar para mostrar abertura e ausência de preconceito contra as ciências humanas e contra a criação”. (Barbosa, 2002:52)
O projeto vem ao encontro dessas palavras mostrando a relevância da atualização conjunta do educador, do cientista social e do artista, na conciliação entre métodos de pesquisa, ação extensionista, criatividade e sensibilidade artísticas.
[1] Esta região corresponde aos municípios de Campos dos Goytacazes, São Francisco de Itabapoana e São João da Barra. Encontram-se 149 unidades de ensino nesses municípios, sendo 112 unidades situadas em Campos dos Goytacazes, 23 em São Francisco do Itabapoana e 14 em São João da Barra. Estão em funcionamento 15 CIEPs no primeiro município e 1 CIEP em cada um dos demais municípios citados.
[2] Não são estatutários nem celetistas, mas mantêm um “vínculo” com o Estado na medida em que possuem matrícula na sua estrutura administrativa.

Idéias iniciais

A Educação é um espaço de socialização constitutivo do cidadão na modernidade em sua dupla condição de sujeito de conhecimento e de sujeito de direitos. A universalização de educação básica, na passagem do século XIX para o XX, torna-se um dos fundamentos da sedimentação do Estado-nação.
Esse processo, contudo, é entrecortado por dilemas e paradoxos inerentes à forma como cada sociedade vivenciou as experiências de igualdade e democratização, que têm conseqüências na universalização da educação básica como expressão da institucionalização dos direitos sociais.
Não é demasiado reiterar problemas tais como evasão escolar e analfabetismo funcional que exigem a revisão e ampliação do sistema educacional. Trata-se, porém, de destacar, para além do número de escolas e de estudantes o sentido mesmo da vida escolar como referência cultural na formação do sujeito capacitado a se perceber como agente responsável numa comunidade mais ampla. A escola pensada como interação social implica sua compreensão como instituição coordenadora de uma vida social ativa e reflexiva.
No Brasil, os anos 20 testemunharam a inauguração do movimento da “Escola Nova” na defesa do ensino público, laico e gratuito. Um de seus principais representantes, Anísio Teixeira (1900-1971), perseguiu a recriação de uma escola criativa e sintonizada com a realidade brasileira. Nessa perspectiva, torna-se primordial a integração entre educação e cultura.
O ideal de escola em tempo integral tal como materializado no Estado do Rio de Janeiro na década de 80, no antigo Governo Brizola, através dos CIEPs (Centros Integrados de Educação Pública), fez surgir a figura do educador-animador cultural com (a) as “manifestações culturais e artísticas, sobretudo daquelas que já se desenvolvem no interior da própria comunidade. Afinal, elas são a ponte viva que leva a comunidade dentro da escola – e vice-versa” (Ribeiro, 1986:49). Completa Darcy Ribeiro (1991:93) (b):

“(...) os animadores são pessoas-chave de todo o processo. São eles que possibilitam o desenvolvimento de atividades como a exibição de um filme para ser colocado em discussão, a realização de concertos, a promoção de expositores (pintura, desenho ou fotografia), a montagem de espetáculos teatrais, a confecção de vídeos, a realização de oficinas de arte, a criação de clubes ou associações de alunos, a realização de jogos e brincadeiras, a promoção de festas comunitárias”.

O animador cultural sintetiza em sua função a “anima” da escola sem a qual esta é “concreto armado” mas não vida. Ao mesmo tempo, em que entrelaça a instituição à sua comunidade, tornando a escola parte da história daqueles que lá estão e de suas famílias, o animador cultural organiza o diálogo entre educadores e educandos nas diversas áreas do conhecimento. A arte é sua “ferramenta” por excelência. Contudo, o animador cultural distingue-se do professor de educação artística na rotina escolar. A cultura é a matéria-prima do animador cultural. Tem seu sentido ampliado e aplicado à idéia de transformação social. Diz Joel Rufino que a cultura é uma “forma de comunicação, um circuito, que pode estar em todo lugar e em lugar nenhum, capaz, na atualidade, de organizar parte das relações sociais e, portanto, de ensejar ações do Estado em favor dos pobres”. (Santos, 2004:235).

Quem somos nós?

A criação desse blog é uma experiência de comunicação iniciada no projeto de extensão "A Animação Cultural ontem e hoje: valorização profissional do trabalhador da cultura na Escola Pública - Norte Fluminense 1". Essa pesquisa-ação integra a co-participação do público dos animadores culturais dos CIEPs e escolas estaduais da região administrativa Norte Fluminense 1 - correspondendo aos municípios de Campos dos Goytacazes, São Francisco de Itabapoana e São João da Barra - estabalecida mediante parceria PROEX / UENF - Coordenação Regional da Animação Cultural do NF1.
A professora e pesquisadora Adelia Maria Miglievich Ribeiro (Doutora em Sociologia - UFRJ) coordena a equipe de extensão na qual participam a bolsista Andreza Barreto Leitão (graduanda em Ciências Sociais - UENF); os bolsistas "Universidade Aberta" Glauber Rabelo Matias e Paulo Sérgio Ribeiro da Silva Jr. (Sociólogos - UENF); o parceiro externo Robson Ribeiro Pessanha (Animador Cultural / Coordenador da Animação Cultural na região NF1); os voluntários Fabiano Ferreira Rangel (graduando em Ciências Sociais - UENF), George Gomes Coutinho (Assistente Social - UFF / Mestrando em Políticas Sociais - UENF) e Rudolf Rotchild Costa Cavalcante (Animador Cultural na região NF1 / Sociológo - UENF).

Tuesday, July 18, 2006

Teste

Blog dos Animadores Culturais do Estado do Rio de Janeiro, Região NF1